Em meio à recuperação gradativa no Hospital Mário Gatti e fragilizada pelos danos físicos e psicológicos sofridos após ser atingida por um eucalipto de 20 metros no Taquaral, em Campinas (SP), a engenheria ambiental Gabriela de Araújo Rodrigues, de 27 anos, contou ao g1 sobre o que ela lembrou do resgate no acidente que terminou ainda com a morte de Isabela Tiburcio Fermino, de 7.
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A tragédia na principal área pública da cidade foi em 24 de janeiro e, na segunda-feira, Gabriela deixou a UTI após dois procedimentos cirúrgicos. Além de explicar que tudo ocorreu sem ela perceber de imediato, a sobrevivente enfatizou que os socorristas chegaram rápido e afirmou que, sem ter perdido a consciência apesar da dor, ouviu um relato que pode indicar suposto problema na árvore que caiu.
“Eu ouvi alguém dizer, acredito que pelo comentário seja um funcionário, que ‘ele já tinha avisado sobre essa árvore’. Ou seja, já tinha indícios de problemas na árvore, entretanto, disse que ‘falavam para eles apenas podar'”, relatou Gabriela.
Gabriela disse que ficou caída e imobilizada logo após a queda do eucalipto, à espera do resgate, e, por isso, não conseguiu identificar quem era o autor da fala. A prefeitura, porém, disse que a árvore estava sadia – veja abaixo posição na íntegra. Na semana passada, o secretário de Serviços Públicos, Ernesto Paulella, afirmou que “a queda se deu por causa da saturação do solo, muita chuva, esse é o motivo”.
Diante do contexto, Gabriela sinalizou que deve acionar o Poder Judiciário com o propósito de “deixar a prefeitura ciente da necessidade de fazer os reparos necessários e para que não aconteça de novo”. A expectativa da jovem é deixar o hospital municipal nos próximos dias para seguir com a fisioterapia.
A mãe, ao lado dela no hospital, relatou momentos de angústia e concordou com a avaliação da jovem de que a medida é necessária para prevenção. “Eu poderia ter perdido minha filha”, falou.
Piquenique e corrida por impulso
O acidente com Gabriela ocorreu quando ela estava na terceira volta pelo parque com o namorado, e aproveitava o fato de que o tempo estava aberto. Antes, ela havia cogitado ir embora, mas estendeu o passeio que não tem hábito de realizar em dias úteis e se surpreendeu com a beleza do piquenique organizado pela família de Isabela, que estava no local para celebrar o aniversário de uma prima.
Gabriela e a mãe deixaram Campinas (SP) para morar em Sumaré (SP) desde 2009, enquanto Isabela residia com os pais em Hortolândia (SP). Segundo a jovem, nada de diferente havia se percebido.
“Eu olhei, e falei: ‘Olha, que bonitinho!’. Então eu ouvi um estalo e percebi as pessoas correndo. Por impulso comecei a correr, não entendi o que estava acontecendo. Só entendi quando senti os galhos em cima de mim. Não perdi consciência em momento algum. Os galhos me empurraram, não fiquei embaixo. Minha coluna torceu, da parte do quadril para baixo não sentia nada, minha coluna estava comprimida. Graças a Deus fui resgatada rápida”, explicou sobre o dia do acidente.
As lesões sofridas, segundo a engenheira, foram: uma vértebra “de transição” quebrada que exigiu dois procedimentos cirúrgicos, além de uma fratura na costela que também gerou uma pequena lesão no rim. Ela está em estado estável, deixou a UTI na segunda-feira e sabe que precisará de fisioterapia durante uma recuperação gradativa. Ela não perdeu os movimentos de membros, mas menciona que neste momento houve uma “perda de força motora”, que a equipe médica destaca ser provisória.
“Fiz a cirurgia de coluna, tive que colocar oito parafusos para descomprimir e alinhar. Depois disso eu tive que fazer uma reparatória porque um dos parafusos não tinha ficado certinho no lugar […] No início foram movimentos só nas pontinhas dos dedos, depois formigamento, hoje está melhor consigo alguns movimentos. Acredito que essa semana já saia do hospital”.
Gabriela contou ainda que precisou, neste período de internação no Hospital Mário Gatti, colocar um dreno por conta de secreção pulmonar. A recuperação é demorada. “Sinto medo do que aconteceu, me dá ansiedade, não sei se precisarei de um acompanhamento psicológico para lidar com isso porque a cena muitas vezes vem na minha mente. Hoje estou me sentindo muito grata, nasci de novo”, falou.
Aprovação em concurso
Durante o período de internação, Gabriela recebeu a notícia de que foi aprovada em um concurso público de Hortolândia para atuar na Saúde, com foco na área de zoonoses. A mãe, Neusa Rodrigues, foi quem levou os documentos necessários para assegurar a vaga da filha no novo trabalho.
“Era algo que eu almejava [aprovação no concurso público] Um dia de cada vez. Agora é ter paciência para a recuperação que não é tão rápida. Grata por estar saindo dessa situação mais difícil e animada para voltar para casa e começar a fisioterapia e voltar a andar como antes”, destacou. A prova do concurso foi realizada por ela em agosto de 2022.
O caso do acidente no Taquaral é investigado pelo 4º Distrito Policial de Campinas. Além disso, o Ministério Público de São Paulo (MP-SP) também abriu um procedimento para apuração e pediu um parecer para um órgão interno técnico sobre as condições das árvores do parque.
O que diz a prefeitura?
Em nota, a prefeitura defendeu que toma medidas para evitar acidentes, ressaltou a assistência médica à jovem e destacou que o tratamento após após alta ainda será definido. Além disso, ela se manifestou sobre o relato que a jovem diz ter ouvido após o acidente no Taquaral. Veja íntegra.
“A Secretaria de Serviços Públicos informa que a árvore em questão não foi podada recentemente. Quinze dias antes do acidente, a Pasta realizou, na lateral do alambrado, a poda de eucaliptos que cresceram tortos (fototropismo). Depois das chuvas do dia 17/01, prosseguimos com poda de árvores na Lagoa do Taquaral, mas não de eucaliptos.
Os laudos técnicos do Instituto Biológico e do IPT (Instituto de Pesquisas Tecnológicas) é que vão revelar o motivo da queda. Visivelmente, a planta estava sadia.
A Prefeitura sempre toma as medidas necessárias para evitar acidentes. Mesmo antes do acidente, o Departamento de Parques e Jardins (DPJ) realizava a poda preventiva de árvores.
Outra medida adotada foi o fechamento dos parques e bosques até que o solo seque, já que a grande causa de queda de árvores neste período é o excesso de água no solo.
O Hospital Municipal Dr. Mário Gatti presta toda a assistência médico-hospitalar necessária à paciente. O tratamento a ser seguido após deixar a unidade será definido na programação da alta hospitalar, quando a equipe médica fará o encaminhamento necessário.”
Chuvas castigaram a cidade
Campinas vive uma situação de destruição por conta dos fortes temporais da semana retrasada, sobretudo no dia 19, quando choveu 125 mm – a terceira maior precipitação da história da cidade.
A Defesa Civil registrou ao menos 200 quedas de árvores, pontes caíram e famílias ficaram desabrigadas naquele temporal. O governo municipal decretou situação de emergência.
A Pedreira do Chapadão, outro espaço de lazer do município, foi interditada um dia antes do acidente no Taquaral por conta do risco de desmoronamento de pedras provocadas pela chuva.
Morte por queda de árvore em dezembro
Em dezembro, uma árvore caiu em cima de um carro e matou o técnico em eletrônica Guilherme da Silva de Oliveira Santos. Em 23 de janeiro, o g1 obteve com exclusividade o resultado da análise, que apontou a presença de quatro fungos no vegetal, mas descartou a existência de doenças. A principal hipótese do IAC é que a queda foi causada pelo excesso de chuva.
O caso ocorreu na manhã de 28 de dezembro durante uma forte chuva. O técnico em eletrônica de 36 anos passava pela Rua General Marcondes Salgado quando foi atingido e morreu.